







Depende do nosso capital humorístico gostarmos mais ou menos de Andy Riley. Uma inclinação para o humor enegrecido é factor essencial para esboçar um sorriso (ainda que mental), um riso contido mas verdadeiro (daqueles rápidos mas sinceros) ou uma gargalhada aberta. De qualquer forma, é inegável a criatividade de Andy e, principalmente, a capacidade de fazer humor com temas aparentemente paradoxais. É ou não a vida uma tragicomédia?
“Coelhos há muitos”, dizem. Lembrando: temos o antropomórfico Bugs Bunny, o possivelmente lunático Coelho da Páscoa, o Coelho Branco de Alice no País das Maravilhas (também antropomórfico), o retro Topo Gigio (ops… este não é um coelho, é um rato!), o “Bing Bing Bing! Coelho Ricochete” (antropomórfico), o pré-Mickey Coelho Osvaldo (antropomórfico) e os biofóbicos coelhinhos suicidas de Andy Riley (extremamente antropomórficos, por sinal). Conclusão: a maior parte dos coelhos são antropomórficos, assim como o serão, por dedução e como iremos ver, a maior parte dos porcos.
Andy Riley é escritor (cartoonista e autor). Andy Riley também desenha, não tendo, no entanto, um estilo ilustrativo surpreendente (o que também não se revela necessário, pois a ideia-base é conquistada pela simplicidade, pelo esboço, pelo cariz infantil). Andy Riley escreve essencialmente comédia. Andy Riley é o autor e ilustrador de diversos livros: "The Bumper Book of the Bunny Suicides – Fluffy Little Bunnies Who Just Don’t Want to Live Anymore" (“O livro infantil/ilustrado dos coelhinhos suicidas: coelhinhos fofinhos que apenas já não querem viver mais”), “O regresso dos coelhinhos suicidas”, “Grandes mentiras para dizer a crianças pequenas”, “Muitas mais mentiras para dizer a crianças pequenas”, “D.I.Y. Dentistry” (por aproximação: “Dentista faça-você-mesmo”), e o seu último grande hit: “Porcos egoístas”. É sobretudo sobre os coelhinhos suicidas e também um pouco sobre os porcos egoístas que se debruça este artigo.
Como se pode constatar, a maior parte das “tiras” de Andy Riley são apenas o punchline da história. A mente do leitor automaticamente empreende a conquista do set-up – a estória que antecede a imaginativa perda de vida do animal. Por vezes é difícil encontrar o coelho suicida na vinheta, restando apenas um resquício gráfico das orelhas. As orelhas pelo coelho – sinédoque gráfica desse mamífero que adivinhamos com uma postura indiferente, até divertido ou aliviado, enquanto espera pacientemente, lendo um livro acompanhado de um drink, o golpe fatal.
Dos coelhinhos bonitos, queridos e fofinhos com tendências suicidas passamos drástica e paradoxalmente para o egoísmo descarado dos feios porcos, e maus. “Selfish pig” – a dramática injúria inglesa – deve ter sido a gota-de-água para todos aqueles coelhos. Numa arrogância perversa e infantilizada, estes porcos egoístas atravessam o quotidiano com um menosprezo ignóbil pelos outros, com o focinho contorcido, saciando o seu ego com uma carência atencional rebuscada.
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